O Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (TCE-PE) abriu uma auditoria especial para apurar uma suposta fraude em uma licitação de R$ 3,4 milhões da prefeitura do Recife para contratação de empresa que presta serviços em festas da cidade. A informação foi publicada na manhã desta sexta-feira (15) por Guilherme Amado, do Metrópoles, e confirmada pelo blog de Jamildo.
A abertura da auditoria foi determinada no último dia 12 de março por decisão do conselheiro Ranilson Ramos, relator do caso. O despacho acata pedido do Ministério Público de Contas (MPCO), que aponta a necessidade de investigar possíveis irregularidades na licitação, aberta pela Fundação de Cultura da Cidade do Recife (FCCR).
A empresa contratada foi a MC Produções e Eventos Culturais LTDA, que tem sede em Camaragibe, no Grande Recife. O valor estimado na licitação era de R$ 4,1 milhões, mas o valor homologado ao final do pregão eletrônico ficou em R$ 3.417.766,00.
Segundo a denúncia, a licitação recebeu propostas idênticas da MC Produções e de outras duas empresas diferentes que teriam proximidade entre si, "indicando conluio para fraudar o certame".
Outra irregularidade apontada na denúncia é o fato da MC Produções ser uma Empresa de Pequeno Porte (EPP), com capital social de R$ 300 mil segundo a Receita Federal, e mesmo assim ter ficado responsável por um contrato de três milhões, "restando dúvida sobre a sua capacidade operacional".
De acordo com o edital, o contrato tem validade de 12 meses e prevê a prestação de serviços de apoio técnico e operacional na área de logística e infraestrutura em ações culturais realizadas ou apoiadas pela FCCR, como os ciclos carnavalesco e junino. A empresa, inclusive, já prestou serviços no Carnaval 2024.
"Está-se diante de fato gravíssimo, com a apresentação de propostas idênticas, denotando participação apenas formal das empresas, a fim de conferir aparência de legitimidade ao processo licitatório e de simular uma competição", diz trecho do despacho da procuradora Eliana Maria Lapenda, no último dia 27.
O pedido do Ministério Público de Contas tem como base uma denúncia do vereador Alcides Cardoso (PSDB), líder da oposição na Câmara Municipal. No dia 7 de fevereiro, o parlamentar já havia apontado as supostas irregularidades no processo licitatório.
Segundo Alcides Cardoso, na pesquisa de preços da Fundação de Cultura do Recife, três das quatro empresas consultadas possuem relações comerciais de muita proximidade, sendo uma delas a vencedora MC Produções.
Ele diz que duas dessas pessoas jurídicas têm sócios com evidentes indícios de familiaridade. E uma delas é registrada como Microempreendedor Individual (MEI), com capital social de apenas R$ 5 mil, “evidenciando a incapacidade de se apresentar como proponente de preços para contratação pública”.
"A empresa vencedora – MC Produções, Promoções e Eventos Culturais Ltda. – teve relação comercial em 2022 com outras duas proponentes de preços: a 7&8 Produções, com saldo final de mais de R$ 192 mil no balanço contábil da MC, e a Avive Produções, com relação comercial em 2022 de mais de R$ 9 mil. As pessoas jurídicas da 7&8 Produções e da Avive Produções são de propriedade de pessoas físicas com o mesmo sobrenome, o que ressalta a necessidade de averiguação", diz trecho de ofício de Alcides.
"Todos os fatos apontados nos nossos ofícios endereçados aos órgãos de controle, que foram baseados em documentos públicos constantes da base da Prefeitura, nos trazem elementos para crer que a licitação foi supostamente dirigida para beneficiar a empresa vencedora desde o seu início, com participação de possíveis empresas laranjas ligadas a ela, e que pode ter havido por parte da Fundação de Cultura aceitação e facilitação para que isso ocorresse”, completou o parlamentar.
Na representação interna do MPCO, é apontado que empresas que concorriam com a MC Produções em certames da prefeitura apresentaram menores preços e mesmo assim foram desclassificadas, sob a justificativa de não atendimento de itens do edital.
No despacho do conselheiro Ranilson Ramos, obtido pelo blog, a FCCR enviou manifestação de defesa afirmando que toda a plataforma onde se desenrolou o processo licitatório é público, "o que evidencia com clareza que não ocorreu nenhum favorecimento ou ilegalidade".
Sobre a possível relação comercial ou familiar entre as empresas licitantes, a Fundação afirmou que "nada interferiu no resultado do pregão".
"Esta Fundação de Cultura não solicitou cotações de preços apenas a MC Produções e Eventos, a 7&8 Produções e a Avive Produções, Soluções e Serviços Ltda. Também foram solicitadas cotações de preços a outras quatro empresas, perfazendo um total de sete solicitações, onde apenas quatro empresas responderam às referidas solicitações", explicou a defesa.
O conselheiro, porém, entendeu que as irregularidades noticiadas demandam apuração mais aprofundada.
"Cabe determinação para abertura de Auditoria Especial com o objetivo de apurar as possíveis irregularidades nos Pregões Eletrônicos n°s 016/2023 e 13/2022 e contratações deles decorrentes, com indicação da responsabilidade, com análise dos fatos, identificação dos responsáveis e quantificação do dano, se houver, com citação de todos os possíveis responsáveis, assim como de empresas beneficiadas, na forma regimental", diz a decisão.
A reportagem entrou em contato com o Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (TCE-PE) para saber em que ponto está a auditoria, mas não recebeu retorno até a publicação desta matéria.
Procurada pelo blog de Jamildo, a prefeitura do Recife informou que o processo licitatório foi homologado e publicado no Diário Oficial do Município, cumprindo a legislação vigente.
A gestão João Campos disse que, no decorrer do processo, a FCCR prestou esclarecimentos ao Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (TCE-PE), sendo inclusive indeferido o pedido de cautelar requerido por uma empresa desclassificada.
"Após decisão do TCE favorável à prefeitura do Recife, o processo licitatório teve seu regular andamento e as contratações já foram formalizadas, sendo, devidamente publicadas no último dia 3 de fevereiro, de modo a garantir o maior Carnaval da história da cidade", acrescenta a nota.
"A Fundação de Cultura Cidade do Recife reforça que na referida licitação houve ampla concorrência das empresas interessadas e reafirma a participação de 14 empresas no certame. Sobre a auditoria especial, a FCCR entende que se trata de uma ação inerente à própria atividade da Corte de Contas", finalizou a prefeitura.
A MC Produções, por meio de sua assessoria jurídica, informou que não foi notificada sobre o assunto até o momento e que desconhece qualquer irregularidade relacionada à licitação, mas que vai verificar o processo junto ao Tribunal de Contas do Estado e ao Ministério Público a fim de entender os fatos.
A nota também diz que, após uma das empresas licitantes ingressar judicialmente objetivando uma cautelar junto ao TCE e ter a cautelar negada, a MC Produções seguiu as etapas legais de praxe previstas no edital de licitação e foi "devidamente convocada, habilitada e declarada vencedora".
Fonte:Blog do Jamildo